Sonntag, Dezember 23, 2012

Vazio

  O título é mais pela falta de criatividade para um título decente do que por qualquer significancia maior. Estou lendo Baricco faminta. Nao, nao é um eufemismo. Acordei hoje meio sem saber muito se realmente tinha acordado, sabe-se lá o motivo mas meus olhos aqui permanecem constantemente embacados, nao só os olhos, o olhar também. Vai ver por isso eu nao posso sentar sossegada no pub e tomar minha cerveja-cor-marrom quieta. Enfim, nao comi nada o dia inteiro. Junto a fome somou-se a preguica: duas horas para se arrastar para um banho, mais duas horas para responder ao namorado. Sim, sim; eu e o G. estamos oficialmente juntos agora, e tenho que confessar que ele é a melhor dor de cabeca do mundo, rs. Vai entender, mas cada desentendimento que passo com ele nao move um milímetro sequer do meu amorzao, assim colorido, por ele.
  Lendo Baricco aqui me faz lembrar que eu abandonei cinicamente o meu Calvino "As cidades invisíveis" na minha estante no Brasil. Se eu pudese teria trago todos, palavra. Mas tive que cometer o sacrilégio de trazer apenas um Dostoiévski, um Cortázar, um Tchekhov e tres Bariccos. Tudo para tentar fazer minha adaptacao no Velho Mundo menos sofrida, ou quem sabe, fazer lembrar do quao as coisas sofridas podem ir soltando gominhos de beleza, às vezes até sem machucar.
  Pus o "Meat is Murder" dos Smiths para tocar agora, vai que combina com o domingo né? Hoje fiquei contrariadíssima na rua porque chovia fininho - mas molhava - e eu sem guarda-chuva: domingo, tudo fechado, um saco. Amanha será uma correria sem fim para comprar o presente da molecada correndo, voltar, pegar minha bolsa e partir para Erkelenz passar o Natal com a Paula. A ceia será no almoco e à noite festinha privada com uns amigos de Düsseldorf, ou quem sabe um clube, ou quem sabe só perambular com uma caneca de Glühwein pelo Altstadt.
  O próximo módulo do curso comeca dia 15 e eu mal posso esperar para seguir com os meus estudos de língua alema, apesar de sentir até agora que na verdade é uma revisao esclarecedora, nao uma aula. Coisa que a UFF passou longe de fazer por mim. E sinto que ao final disso tudo será decisivo. O problema, antes de tudo, nao é a falta de comunicacao, mas a impossibilidade de fazer os pontos baterem do "o que é pra mim nao é para voce" e assim sucessivamente. Deus tenha a bondade suficiente de me dar paciencia. E um pouco, assim, de coragem. Porque uma normalidade e má vontade passou bem perto por aqui, e combinada com a minha impulsividade nao é fácil de adivinhar o tamanho do estrago em tudo que se faz vivo perto de mim.

Montag, Dezember 10, 2012

Neve

"But if you fall asleep in the snow, you don’t feel death coming. Take care."
Paris Je´taime



  Lembrando que no final do meu último post  eu avisei que iria acontecer umas quarenta coisas na minha rota até München. Levantei cedo na sexta-feira, na verdade no mesmo horário cedo de sempre que sao os meus dias da semana aqui. Enquanto arrumava a Spühlmaschine vi que flocos pairava no ar e fluíam até o chao, grama, telhado...Era neve. Até aí tudo bem, afinal de contas eu tinha assistido nevar com os pequerruxos aqui, tudo certo; mas em cerca de quinze minutos eu teria que sair para a VHS.
  E saí, os flocos caíam de maneira rápida e violenta, parei na metade do caminho observando que meu casaco estava coberto de neve, assim como a minha bolsa, e eu mal conseguia enxergar o caminho, pois ventava neve diretamente em meu rosto, o que tornava tudo frio e irritante. Parei na Trinkhalle para comprar meus cigarros (de Camel passei a fumar agora John Player) e o atendente me advertiu: seu casaco nao é bom para a neve, voce precisa de um melhor. Isso era um fato incontestável - a julgar pela minha aparencia de boneco de neve -, mas eu nao consigo entender como passei de boa com esse casaco em um inverno gelado no extremo norte da Holanda. Egal, em alguns dias meu casaco quentinho e com toda a protecao contra umidade-chuva-neve chega. Dei meia volta e voltei para casa, fiquei metade do dia emburrada por ter perdido aula por algo tao bobo como estar nevando. Mas dificuldade é dificuldade, nao é mesmo? E essa foi a minha dificuldade do dia.
  Nisso a viagem para München comecou a desandar, até porque eu nao queria me arrastar até a Kirche com uma mala debaixo de neve para pegar o onibus, Para completar o motorista escreveu avisando que teve problemas no motor do carro, entao nada feito: viagem cancelada. Quem pulou de alegria com o fim repentino da viagem foi o G. que estava um pouquinho enciumado, rs. Enfim, no dia seguinte o vilarejo era só neve por todo canto e o mais legal: com sol. Entao o estresse foi diminindo e eu até fiz alguns registros da breve passagem de neve pelos lados de cá, uma fofura. Abaixo o G. na volta do supermercado:




  Lindao até o céu, levando meus dois packs de Becks lemon . Combinamos de fazer um boneco de neve no domingo, mas a chuva veio e com ela toda a neve se derreteu. Uma pena, já estava comecando a perder a birra da neve, mas pelo que vi, nos próximos dias irá nevar mais, entao o meu boneco de neve deve sair em breve! Domingo também foi dia de döner, pommes e stammtisch com o Ferdi. Antes brincar de verstecken com o Jannis, olha a fofura aprontando no meu quarto:


                              

  

Tudo aqui tem fluído para uma normalidade simples, mas isso de longe nao impede que eu fique saturada ou chateada ou simplesmente estressada com tudo e queira fazer sabe-se lá o que com a minha vida. Às vezes a vontade é de seguir um plano infinito de sempre cortar caminhos e cruzar esquinas que nao se batam mais; às vezes a vontade de deixar nao só as pegadas na estrada, mas fazer de algum canto um lar me aparece em mente de novo. Mas ainda é cedo e doloroso tentar esbocar qualquer tipo de plano que nao seja no ambito profissional. De qualquer maneira, nao me vem vontade alguma de encerrar qualquer tipo de ciclo, deixo agora a vida trabalhar sozinha.


Donnerstag, Dezember 06, 2012

Schlafzimmer, 6 de dezembro de 2012.

Grüße Ihnen!

Escrevo novamente do meu quarto, me empaturrando de cookies e chocolates. Completei dois meses de Alemanha no último dia 20 e me assustou muito como as semanas aqui se encurtam com a chegada do inverno. Por falar em inverno, no último sábado passei a experiencia fofura de assistir junto com os meninos o primeiro dia de neve da cidade, e foi logo no sábado do advento. Foi lindo, e o melhor: estava em casa e nao passei frio, rs.
  Ontem a noite conseguiu se superar no que se diz respeito à felicidade. Eu fico realmente surpresa - e de uma forma que em paradigma sintagma nenhum caberia - sobre como a cada dia que passa, mesmo depois de discussoes estratosféricas, nós conseguimos nos gostar ainda mais e ser mais felizes ainda um com o outro. Por isso digo: nao há lindeza maior no mundo maior que a sua, e todo seu cuidado comigo, e toda a sua dedicacao, e aquela lista imensa de qualidades que eu nunca imaginaria encontrar em alguém (a julgar pelo fato que atravessei o oceano, até que saiu em conta).Os dias nunca mais serao tao cinzas...
  Amanha vou de mitfahrgelegenheit (carona) para München visitar finalmente o Alex. Depois de dois anos de amizade e uma promessa - que parecia furada! - de dar um oi pessoalmente na Baviera, acho que nada mais justo do que viajar algumas poucas horas e tomar aquela cervejinha esperta lá para os lados do sul. Quem sabe conversar um pouco em bayrisch ao invés de hochdeutsch (nao mesmo, hein). Mas tou super animada, pena que o cansaco dos dias - acordar cedo, dormir pouco, ir para o curso, estudar, ler, brincar com as criancas - nao estao me deixando arrumar de uma vez minha pequena mala de viagem. Um medo de rolar a mesma coisa que na viagem para Köln e eu perder minha carona para München; que umas quarenta e tantas coisas vao acontecer no meu caminho até lá nao é novidade, entao aguardem meu próximo post.
  Tem sido cada vez mais difícil escrever enquanto espero o onibus ou no caminho de algo. Meus dedos ficam para congelar e escrever de luvas vai dar pinta de Parkinson, mas prometo me esforcar mais; afinal de contas é bem mais legal aquela sensacao ao vivo que eu tento passar para voces. Guten Abend!

Samstag, November 10, 2012

Atualizando II.

  Escrevo recém saída de um banho frio. Aliás foi um semi-banho a julgar pelo inverno que anda dando as caras por aqui. No espaco de uma semana muita coisa aconteceu, e foram coisas boas. A verdade é que cada dia eu me integro mais aqui, isso foi difícil - como toda tentativa de adaptacao - mas natural. Sendo mais clara e objetiva: estou feliz. E com toda a licenca do mundo (nunca escrevi palavrao neste blog), pra caralho.
  Claro que a felicidade tem nome, mas nao se baseia só nele. Comecei o curso de alemao e estou achando simples, talvez eu deveria ter me matriculado em um nível mais avancado, mas eu preciso de vocabulário, nao é mesmo? Ain, péra, deixa eu me ajeitar aqui na cama. Pronto. Entao, o domingo passado produziu uma segunda-feira muito triste e desnecessária, resultado: conversa em família. Como é bom pedir desculpas, minha gente! Como é bom simplesmente querer consertar as coisas, e só a tentativa já acalma o coracao. Assim a semana seguiu com muito cansaco - mas um cansaco bom, vejam bem - e com um lindo prato de Bratwurst com batatas fritas e muita maionese, rs.
  A atencao agora vai para o sistema de transporte alemao: me deixa completamente maluca. Para voces terem uma ideia quase me perdi de novo ontem na volta do curso. Mas algo brilhante: meu boleto pago do curso serve de passagem! Um onibus e um trem, mas é um caminho curto e simples, o problema é que para voce se movimentar por aqui seguem uma lista de conexoes intermináveis onibus-trem que dá um pouco nos nervos. O negócio aqui é dirigir!
  Vamos à fofoca: nao vou postar nomes aqui, mas vou contar os fatos (ao menos superficialmente). Ele é lindo. Demais. Estar com o G. é correr e pular no colo dele quando nos encontramos, trocar beijos e bobagens no ponto de onibus por 15 minutos (sim, ele sai de casa só para me levar no ponto quando eu saio com as outras meninas), fazer brincadeiras tolas enquanto estamos deitados assistindo tv, olhar durante horas nos olhos depois do sexo, receber um beijo na testa e nos ombros de repente, ser carregada na bicicleta no meio da madrugada por toda a cidade rindo alto, ver ele preparar o jantar e malandramente por um jarrinho com flores no centro da mesa, assistir ele comer rápido, nao ter vergonha de falar de boca cheia, ser abracada por trás até chegar no sofá da sala, escutar ele perguntando de cinco em cinco minutos se está tudo bem. É ele sair correndo da boate pra te encontrar só porque voce esta na mesma cidade, é ele fazer o maior esforco do mundo para tentar dizer alguma coisa interessante na sms. É, enfim, ser feliz.

Um abraco bem apertado em todos.

Mittwoch, Oktober 31, 2012

Atualizando.

  Entao, hoje é daqueles dias legais em que eu tenho o tempo quase todo só para mim, mas o máximo que consegui fazer foi lavar algumas roupas. Sem qualquer tipo de chance - é porque houveram tentativas - de arrumar meu quarto e limpar o banheiro. Nao quero nem pensar no esforco sobrenatural que farei para ir lá fora por as garrafas de vidro na reciclagem; e faz um dia absurdamente lindo lá fora, com direito a sol, céu azul e apenas 9 graus na temperatura. O problema é que hoje eu acordei no Brasil. Nem lembro o que ou com quem sonhei, mas o fato é que hoje eu estou no Brasil. Às vezes parece que a alma resiste aqui e fica eternamente presa lá em Barajas (Madrid) onde fiz a conexao para chegar na Alemanha.
  Estou sozinha em casa e nao quero cozinhar e nem aproveitar o sol na sala e nem escapar sorrateiramente para o parque aqui perto para fumar meu Camel, nada disso. E nao é tristeza ou homesick, até porque eu estou cada dia melhor por aqui. A cultura já nao me pesa tanto, o frio já é amenizado com um bom agasalhamento (e checar sempre a temperatura antes de sair de casa, claro!), e até que - depois de sair com quase metade da Nordrhein Westfalen - eu estou conhecendo alguem super legal e o melhor: desencanada.
  Aproveitando quero compartilhar aqui a diferenca gritante sobre como é sair com um europeu, rs. Eles se portam como verdadeiros cavalheiros mas sem perder a masculinidade, ao menos com o G. tem sido assim. Outra coisa legal é o leque de opcoes que eles nos dao (a maioria, porque o primeiro rapaz com quem eu saí aqui era um verdadeiro pulha), perguntando o que voce gostaria de fazer. Por exemplo na sms que recebi: "Ah Ana, nós podemos nadar, ir ao cinema, escalar, jogar boliche..." - Achei fofura, confesso. Estava tao de saco cheio da vibe um barzinho e um violao que eu estava vivenciando no Rio, viu. Nem dava mais a mínima para qualquer olhada esperta advinda da mesa ao lado, rs.
  Situando todo mundo que le: eu vi o Sven só mais uma vez e nem deu em nada, além de uma conversa frouxa e um climao. Quanto ao ex-soldado alemao, o Ferdi me avisou que ele é um tipo de estelionatário e por isso foi expulso do exército - olha só a minha vibe errada agindo!-. Entao despretensiosamente conheci o G. Foi assim: eu estava saindo com uma amiga para Düsseldorf, mas antes ela queria passar na casa do G. (amigo dela de longa data) para buscar umas coisas e beber uma cerveja, e fomos...Achei ele tao fofura que logo pegamos contato, saímos dois dias depois e ontem. Só alegrias e boas risadas.
 No mais já estou matriculada no curso de alemao em Kaarst. Fiquei surpresa com os elogios da diretora ao meu teste de nível (deu realmente o nível B1). Comeco na próxima terca-feira. E com o passar dos dias e das preguicas vem em todos eles meu aniversário de 23 anos. Credo, viu.

Freitag, Oktober 26, 2012

Viersen, 25 de outubro de 2012.

  God bless Germany!, finalmente achei um apanhado de lojas com precos acessíveis para o meu bolso, que aqui é independente. Olha a felicidade da moca ao comprar um cardigan quentinho e muitas leggings por apenas doze euros, isso mesmo! E ainda comprei uns cacarecos para o curso de alemao. A Volkshochschule, aliás, é a minha próxima parada.
  A entrevista no departamento de estrangeiros foi simples. Em tres semanas eu recebo meu RG alemao, ow lindeza! É ótimo demais ir se acostumando aqui; aquele sentimento de sossego e vitória de achar tudo, resolver tudo por conta própria. Claro que meus amigos alemaes tem feito de tudo para me ajudar, ao que vou ser eternamente grata, e nao mais guardar uma mágoa bem ranzinza como eu achei que fosse ter daqui nas primeiras semanas.
  O próximo passo é pedir meu Monatskarte, uma espécie de Riocard daqui. Como nao sou eu quem pago, meu salário irá render mais (a passagem aqui é absurdamente cara!), daí vou poder preparar melhor meu enxoval de inverno, que promete ser rigoroso! O pessoal do ponto de onibus deve estar achando a maior trela a carioca aqui toda de rosa, com uma caneta de sorvete na mao e escrevendo num caderno que tem na capa a Audrey Hepburn em Bonequinha de Luxo. O caderno e a caneta foram presentes da Dressa, inclusive.
  O dia aqui está lindo, mas é um lindo Ana: cinzento, nevoento e árvores quase carecas. Em poucos minutos o onibus chega, e lá vou eu fazer minha matrícula e depois comer um enorme e delicioso kebap. Com pommes frites, bitte!

Mittwoch, Oktober 17, 2012

Schiefbahn, 17 de outubro de 2012.

  Milagre de ressurreicao do terceiro dia eu estar escrevendo de casa (mais especificadamente meu quarto), nao? Pois é, a fase da afirmacao em um lugar, a época de travar conhecimento já foi, resumindo: já encontrei uma brasileira aqui no vilarejo (nao, eu nao era a única relíquia latino-americana aqui, humpf!). Também depois do vomito ferino da dona Carminha aqui sobre mim resolvi desacelerar.
  Entao lá vai a dica da Ana: lidar com a cultura de outro país nao é fácil. Com a de um país com um passado nazista menos ainda. O mau hálito da xenofobia às vezes me é insuportável; e a vontade de por a mochila nas costas e me mandar de volta para os simpáticos e abertos holandeses só aumenta. Mas tenho que reforcar meu alemao, ir para Tübingen depois de um ano aqui, ficar mais um ano lá e voltar para o tao amado (nem tanto?) Brasil.
  O problema é que na semana passada minha cabeca deu um nó e eu meio que me perdi no que tenho que fazer aqui. Nada que uma boa noite de sono e um pontinho assim de sensatez nao resolvesse! Ah, parei definitivamente de sair com o D. Cacoetes esquisitos e fingimento de que está só com cartao para justificar pao durisse e dividir a conta nao é lá um atrativo para mim. O Sven sumiu (o Sven loiro-alto-lindo, nao o sobrinho de cinco anos do Paul, hein gente!), deve ter tido problemas suficientes em casa depois da nossa última noite - e manha!- juntos. Agora divido meu café, meus cigarros e um pouquinho do meu humor com um ex-soldado alemao que morava em Londres. Uma graca, lindo lindo e o mais importante: gentil.
  Por enquanto a vida está assim, um breve suspiro de cansaco para cada hora que me dou conta de que nao há luz solar no meu quarto (e eu achando que isso nao seria um problema, rs...); outras vezes um suspiro de satisfacao quando caminho pelas tardes aqui, ou quando pego o trem, ou ainda: quando percebo que há em mim forca o bastante para insistir e que a beleza daqui - tao vasta - irá me ajudar facilmente. E nao é ela, por acaso, que salvará o mundo?

Ana.

P.S.: Ditta, seu cartao postal vai sair! Me de só um prazo maior porque nesse vilarejo nao encontro nada (da última vez tive que andar alguns quilometros para achar um pente - nao tinha, entao levei uma escova mesmo rs).

Donnerstag, Oktober 11, 2012

Krefeld, 11 de outubro de 2012.

  Tenho amanhecido em dias frios, mas ensolarados. Hoje o Jannis veio correndo em direcao ao meu quarto (Ana! Ana!) com uma folha de papel: me chamou para ir ao zoológico com ele. Fiquei pululante com meu primeiro passeio em família, nao gostaria de ficar para sempre na rota quarto-pub-do-Fred.
  O zoológico de Krefeld é um lugar maravilhoso. Foi harmonico demais o dia ensolarado, os animais (nada de grades ou jaulas) e caminhar por toda aquela flora outonal. As coisas aqui nao estao fáceis, ainda nao sei quem sou e sinceramente às vezes esqueco o que vim fazer aqui. Uma sensacao louca de estar perdida e meio que vagabundeando pelo mundao. Provavelmente comeco a Volkshochschule mes que vem. Mas voltando ao zoológico: quando abri uma porta me deparei com uma estufa aquecida e centenas de borboletas, de todas as combinacoes de cores possíveis, voavam ao redor de meus cabelos. Esse é um dos momentos da minha estadia aqui que vao ficar eternamente guardados, por amansarem a violencia de se estar longe.
  Cada canto que olho aqui faz um rasgo de uma beleza profunda em alguma parte de mim. E fico feliz; e a homesick cresce os pés e some. O próximo post provavelmente será de Düsseldorf. Nada de badalacao, apenas vou passar o dia lá comprando alguns artigos para o inverno, e by the way, preciso de botas novas. Lembrando que esqueci meu cachecol preto em um quarto de hotel em Willich, rs. Ah, meus queridos!, a Alemanha anda moldando uma nova Ana, nem sempre de forma piedosa.

Dienstag, Oktober 09, 2012

Köln, 30 de setembro de 2012.

  A minha saga até a mitfahrgelegenheit obviamente nao foi concluída. Perdi minha carona, com direito a ligacoes do Herr Kramer perguntando o que estava rolando para eu ter que desmarcar etc. E ainda se virou num ingles super polido, visto que na linha havia uma Ana completamente perturbada e impossibilitada de falar alemao, rs.
  Como nem tudo é confusao nessa vida e a gente tem pausa para descanso, eu cheguei com folga de horário na Köln Hauptbahnhof. Mal saio da estacao e me deparo com uma catedral gigantesca. Tento olhar para as pontas das torres e sou arrebatada com uma espécie de space dementia bem das violentas. Quanta imensidao. Quanta beleza.E brasileiros chegando! Logo encontrei minha turma e daí em diante foi banho, turismo, fotos, chacoalhar a bandeira do Brasil na cara dos alemaes e umas 372 igrejas, rs. Em uma delas havia um coro de freiras que entonavam como verdadeiros anjos. Curti Köln; ao menos pelas catedrais ternurinhas, religiao católica e óbvio: o Rio Reno. Ele está por toda parte e vezemquando paramos num café à beira, fumando nossos cigarros e cantamos you know what you are, you gonna be a star...
  Agitei as meninas para garantirmos nossa cervejinha esperta na parte da noite. Oras!, minha primeira reuniao! Tinha que mostrar logo o jeitao carioca de ser (engracado isso, essa nacionalidade, esse orgulho que cresce na gente quando estamos do lado de cá); entao partimos para um simpático pub irlandes. Ao contrário dos pubs irlandeses no Rio, no de Köln realmente havia irlandeses. E um grupo de ingleses que mal nos deixaram pedir a primeira deliciosa Guiness e já foram comecando uma conversa. Resultado: aquela mesa metade samba, metade Beatles. E um John muito bebum cantando Oasis comigo. E um romance bem fofura com um charmoso professor ingles, né Paula? rs.
  A volta foi conturbada, mas domingo de manha fomos dar um passeio na cidade de Beethoven: Bonn. Bem pequetita e, claro, cheirava a aristocracia. Querendo garantir mais uma cervejinha esperta para fechar o passeio, acabamos tendo problemas com a bagagem. De tanto estourarem nossa paciencia, largamos as bagagens lá mesmo e fomos dar o último Prosit! - saúde em alemao - no mesmo pub. Acabei tendo uma conversa mega descontraída com um irlandes que vive em Köln há alguns anos. Cozinheiro, barba ruiva, aquele nariz enorme e bem torto (!); se continuar assim vou me mudar de mala e alma pros lados da Gra Bretanha, hein, pessoas. Só uma coisa a dizer: recomendo.
  No mais, recuperamos nossas malas e partimos num trem para nossas respectivas cidades. Eu nao consegui chegar tao facilmente porque moro quase numa aldeia indígena - vilarejo MESMO!-, entao peguei um táxi. O cansaco das viagens continua e eu ainda nao sei quando minha essencia chegará aqui. De qualquer forma, o corpo já está.

Montag, Oktober 01, 2012

Düsseldorf, 29. september 2012.

  É, fui lapear em Düsseldorf lindamente e estou quase perdendo minha carona para Köln. Brasilidades na Alemanha. Ainda bem que com um pouquinho de humor e cariocagem o D. achou engracado. A impressao que tenho é de todos torcendo por mim. Vai, Ana! Pega logo esse onibus para Krefeld!
  Tenho urgentemente que estar na Krefeld Hauptbahnhof e só chegarei 11:00h em Schiefbahn. Conto com a minha cariocagem agora. Primeira vez de trem. Hora de comecar a rezar por motivos de: estar atrasada, dormi fora e nao arrumei a mala. Tá que só eu nao estou achando o atraso engracado. 10:42h , hora de comecar a rezar, ajoelhar no meio do trem e tudo o mais, se eu por um pano na cabeca  nao vai parecer tao estranho (a julgar a quantidade de islamicos aqui). Dar com a testa no chao para ver se Herr Kramer nao se emputece com meu atraso. Se o trem para Köln atrasa eu chego lá nao tao linda assim, mas meio que há tempo. Será que o trem já chegou em Kaarst? Eu devia ter feito a minha mala...

Ana.

Montag, September 24, 2012

Willich, 23 de setembro de 2012.

  Cheguei, e junto comigo trouxe uma alergia enorme que peguei no ar seco do aviao. Para melhorar tudo o ar daqui também é seco. Se eu já sabia disso? Claro, foram muitas noites de péssimas respiracoes e nariz sangrando na Holanda, do jeito que o meu nariz está sinto é falta de quando ele só sangrava.
  A cidade é linda e eu já tenho meu canto favorito: o Gartenbier. É lá que acendo o meu Camel depois de sentar satisfeita no banco de madeira, em frente ao escorregador vermelho (ao lado muitas árvores repletas de esquilos).
  Ontem fui à Düsseldorf e aquilo lá é muito Niterói. Nao sei se é pelo número absurdo de chineses, adolescentes querendo impressionar com roupa-cabelos esquisitos, ou ainda, a estrutura incrivelmente comercial daquele lugar. No mais o povo é super educado e solícito. Minhas aquisicoes de lá: um chip para o celular e duas cervejas espanholas (sim, estou na Alemanha e ainda nao bebi cerveja alema, rs).
  O meu quarto aqui é belíssimo. Como é no porao, tem todo um ar de bunker refinado; daí eu posso escolher entre ficar esparramada na cama gigante, assistir um pouco de tv alema, ou ficar no sofá lendo um dos livros que trouxe. Sem comentários para o meu banheiro com a melhor ducha do mundo e uma sauna.
  Como o meu nariz nao está me dando paz desde que cheguei, vou dar uma caminhada para ver se a respiracao melhora.

Ana.

P.S.: Essa semana fui ao supermercado com o Jannis, e num momento de distracao eu o chamei de Sven. Nesse instante eu foquei no rosto dele: tao pálido e com cabelos tao loiros! Seria uma situacao engracada, mas é aquele momento em que a cicatriz aparece ardendo, voce a olha, e descobre, relembra, como ela foi feita, como dolorosamente ela se desenhou ali.

Samstag, September 22, 2012

Madrid, 20 de setembro de 2012.

  Acabo de chegar em Barajas. Foi o voo mais rápido e confortável até agora. Apesar da imigracao daqui ser mais-que-fofa-ternurinha, odiei o lugar. Nao sei se foi pelo orelhao que me engoliu uma moeda de dois euros ou se foi mesmo mágoa por nao saber mexer naquilo.
  Madrid é ensolarada. Quando o aviao se aproxima da cidade, voce pensa que está chegando em Niterói, quando o aviao chega voce tem certeza. Os espanhóis sao muito educados, mas com ares de soberbos, parecem até que esqueceram que estao falidos. Corrigem meu portugues como se soubessem portugues, ou ainda, como se a língua portuguesa fosse um dialeto mínimo - primo paupérrimo - do espanhol.
  Meu voo para Düsseldorf sai em tres horas e eu preciso fumar. Rodei, rodei: nada de fumódromos, e para completar passei um pacote de cigarros para uma espanhola no caixa (para quem advém de fora da UE é mais barato) e estou com medo de barrarem a compra de um macinho simples de Camel, ótimo nao?!
  É isso, vou checar meu embarque para Düsseldorf, nao quero correr o risco de ficar horas a mais na tediosa-ensolarada Madrid.

Ana.

Sonntag, April 15, 2012

D'o encontro marcado

Deixe-me ir ver o sonho, a velocidade, o milagre,
não me detenha com um olhar triste, esta noite
deixe-me viver lá longe, à beira do mundo,
apenas esta noite, depois voltarei.

[Esta História, A. Baricco; p.10]




Ela já estava a caminho. Desespero e aflições loucos daqueles que acometem quando cravamos os pés no ponto de partida, contando nos dedos se o caminho vai ser longo, observando se as pernas dariam um passo realmente largo até onde se quer ir. Tudo isso demorou dentro da mágoa daquele trânsito tão intenso, do descaso do motorista explicando que ela havia tomado a condução errada e que pelamordedeus! não era o fim do mundo, ficaria perto de lá, se os santos assim o quisessem.
A outra já estava lá. Junto com o outro. Ambos se banhando em cerveja e na mesma espera incansável que ela. Risos e histórias em comum de dez anos de espera, que mais parecia ontem, que mais parecia que a longa amizade entre o tempo que se conheceram até o tempo em que se encontraram não parecia uma linha tão basta, mas um descansar louvável do tempo, amortecendo qualquer tentativa de esforço vital.
Ela cruzou ruas, pra lá, pra cá, aimeudeus onde fica isso? Cigarro na boca depois da extensa viagem, vontade de chegar, de alongar as pernas, de sentar, de quebrar as emoções dos cumprimentos direto para o copo de chopp e acabar logo com isso. E chegou. A outra pôs-se de pé, sorriso imenso, aonde é que você estava?!, vem cá, me dá um abraço. O outro já estava de pé há tempos e atrás; sorriso brilhante, olhos piscando, como você demorou! Ah, conversas... tratando o passado tão sonhado e lúdico como uma abreviação e discutindo agruras do presente. Logo, as maldades do futuro. Uma noite que ele não queria que terminasse no até logo, visto tamanha felicidade de se descobrirem juntos e a possibilidade de lhe abrirem um horizonte melhor, depois de tanto tempo de mais do mesmo.
Ela contava os quartos de hora. A outra também. Ele estava bêbado. Elas inspiravam uma pressa absurda dessas que vem com a sobriedade. Ele queria esboçar o horizonte de que haviam lhe falado há pouco a partir desse mesmo dia, se possível naquela hora. Caminharam nas ruas com a insistência dele ecoando nos ouvidos. Elas foram, ele ficou. O até logo saiu numa voz que mal se ouviu. E dentro desse meio esteve a certeza de um vício que estava ali, não só entre eles, mas em muitos outros. Um vício franco, que não destrói, nem machuca.