Samstag, Februar 21, 2009

Eu finjo tanto que vou além do fingimento

Só agora consigo compreender de um todo o que o Arthur quis me dizer com " você tem que admitir que está triste". Não era para eu me olhar no espelho, encarar mais uma vez o rosto macilento e já gasto por tanta maquiagem e dizer: " Estou triste, ok?"; ou ainda, não convencida de tal estado, berrar com imperatividade: " Você está triste sim, olhe bem!".
Era só para eu não levantar minha sobrancelha direita, era para eu não fazer o olhar de calma-desdém, era para eu não ter prendido as lágrimas de forma tão brusca que vazaram para dentro dos olhos e se perderam nas glândulas, secaram. Acontece que nunca secam. E se não é lágrima agora, será um sangramento profundo após a certeza de que continuamos vivendo sem o que nos mantinha vivos. Então, somos fantasmas do que um dia quisemos ser, do que um dia sonhamos. Talvez nem fantasmas, porque esses pelo menos vagam pelo infinito, enquanto nossos sonhos têm que ser esmagados por nós mesmos, para que possamos continuar, para que possamos ser a Ana, para que possamos escutar do melhor amigo: " você tem que admitir que está triste."
Chego agora do bar, nem ao menos tirei os brincos, as mãos anda estão cheirando a Lucky Strike. Aqui, de frente para todos, meus olhos pesam em desgraça, minha maquiagem borra. Meus braços já caíram há muito em cima do teclado, cansados do esforço de tentar não sei o quê. Canto: Estou doente de coração e é assim que as coisas são.

Samstag, Februar 14, 2009

O ritual do eterno

Há um ano atrás:

Ventos balançavam os cabelos do casal. Eles dançavam ao ritmo dessa ventania marítima como se fosse um ritual. Croissants e cafés entre beijos. Cigarros. "Isso um dia ainda vai te matar"; dizia ele. Ela ria e desdobrava a fumaça de seus pulmões na face do amado, uma provocação amorosa que logo levava-os para a cama.



Parece que nunca mais ventou. Ela se recostava no banco do ônibus sem bem saber porquê tinha pego o ônibus. Não estava preocupada, pois nunca há preocupações depois do fim. Olhou para o lado e viu um bebê. Quis chorar, mas riu para a criança, e esse misto de lágrimas e riso a fez parecer ainda mais bonita. Dizem por aí que não há nada como a beleza de um mártir.
Pintou as unhas, depilou as pernas, deu o último trago no cigarro e entrou num banho morno. Vestiu-se, maquilou-se com cuidado e fechou a porta rumo à igreja. Aquela cidade era muito pequena, não havia vento, ou, parecia que o vento tinha se enraivecido da cidade e resolvera nunca mais voltar. Ela tentava equilibrar as sandálias naqueles milhões de paralelepípedos. Mas já estava feito. Talvez fosse culpa dos paralelepípedos, talvez.
Era arroz para todo o lado, os noivos saíam de braços dados da igreja. A noiva com um sorriso rasgando-lhe a face e criando dois pés-de-galinha, o noivo com um sorriso que mais parecia uma interrogação. Se o padre tivesse esperado... Se ela pudesse responder a pergunta: " Fale agora ou cale-se para sempre!". Não pôde ao menos escolher, calou-se, portanto.
Escondeu-se atrás do poste e observou o movimento. Pra quê dissimular a amargura? Ela estava estampada em seu rosto, e o desgosto quase fez seu corpo desfalecer. E se todos vissem esse estado, poriam as mãos no rosto e desesperados perguntariam como um rosto tão malogrado, tão choroso, suplicante e envolvido por pura dor, poderia ser tão lindo, tão iluminado. Uma obra de arte que uma das maldades que a vida traz pintou. Caiu de joelhos, o paralelepípedo lhe ralou.
No dia seguinte, de tardezinha, arrastou-se da cama do hotel. O mesmo vestido, a mesma maquiagem, olhos esfumaçados pelo lápis de olho. Saiu pela rua. Ele estava no barzinho da esquina, a noiva ficara em casa arrumando as panelas. Parou na direção dele. Quando ele olhou, não acreditou. O mesmo vestido indiano bordado, com decote até o umbigo. Os cabelos estavam mais longos, o rosto ainda respirava uma inocência que não existia. Sorriu derrotada. Um amigo chegou, postou-se diante dele tirando-lhe a atenção por alguns segundos. E, de repente, ela não estava mais lá, e em nenhuma parte da rua.
Ele esfregou as mãos na face sentado. Uma fumaça de cigarro invadiu seu rosto, era seu amigo sem querer. Teve vontade de chorar. Como milagre, ventou forte e ainda por cima com cheiro de maresia. Ele olhou para o nada com os cabelos bagunçados. Ela, há muitos metros, teve o vestido sacudido pelo vento. Cigarro, vento, amor: ritual do eterno.

Samstag, Februar 07, 2009

There's the light that never goes out



São 17:21 e eu estou terminando de pintar as unhas de vermelho. Não sei que orgulho é esse de boêmia que não me permite ficar sentada no sofá de casa vendo tv, ou ainda, esparramada na cama de mamãe folheando algum texto. Acho que é porque o dia está quente como há muito não era. Mentira. Mesmo que as ruas estivessem encharcadas, mesmo que houvesse uma grande enchente, eu estaria me descabelando para beber e fumar algo.
Provavelmente, vou me atirar como louca na pista de dança e depois passar o resto da noite sentada - na cadeira mais distante, fato - terminando meus últimos cigarros, e deixando apenas um para fumar de manhã antes de voltar para casa. Já passou da hora de me arrumar, ainda estou nas unhas vermelhas e meu delineador acabou - gastei metade do delineador escrevendo uma carta-. E uma carta que nem mandei. Pra ficar bonito. Porque nosso final é feliz-triste-com-uma-cereja-em-cima.
Agora são 20:02, estou terminando de puxar a meia preta até a cinta-liga. Pronto, abaixei o vestido e calcei as sapatilhas. Não vou passar batom, os olhos estão pretos demais. Vou comprar dois maços de cigarros e ainda vai faltar cigarros para mim. Que o meu pulmão padeça, então.






Mittwoch, Februar 04, 2009

Soma

Título referente à droga de "Admirável Mundo Novo" , Huxley.

Estou cansada de encontros e desencontros. Ir e vir e dar passos de dança enquanto se vem e se vai dói. Estou cansada de toda essa beleza triste, dessas de filmes e livros que as menininhas românticas por aí tanto almejam, é menos doce e mais amargo do que parece. Estou cansada de finais bonitos, porque percebi há tempos que não há final bonito sem ser final triste, pois é assim que não há final, só significados que perduram apunhalando durante toda a vida.
E eu nem pedi grande coisa da vida não. Acho que um útero fértil e um coração saudável é direito de todos que fazem respiração celular, acho. Mas vejo por aí e ninguém quer isso, só eu. A maioria quer o que eu tenho recebido da vida. Não vale a pena. Dir-se-ia que uma vida de sucesso é uma vida junkie, uma vida de noites, de conquistas, de paixões, de vômitos. Eu trocaria tudo isso para ver meu ventre inchar, para descansar a cabeça em algum ombro que não seja o meu, ou ainda, que não seja um dos ombros desconhecidos que tanto conheço por aí.
Estou cansada de contos de fada. Eles na verdade nada tem da leveza e suavidade que tanto nos encantam quando somos crianças. As princesas morrem envenenadas, os príncipes nem se lembram das princesas, a bruxa e madrasta são apenas metáforas do que é nosso destino e o "feliz pra sempre" é um aprendizado, quase um fardo. De ter que transformar sempre as quedas em passos de valsa.

Sonntag, Februar 01, 2009

Eu não preciso parar de beber, eu preciso de verdades

Então o que insistia em incomodar não eram suas lembranças, mas as lembranças alheias. Como era possível sentir tanto por um córtex cerebral que nem era seu? Não é mais questão de não ter vivido, do "ciclo das coisas não acontecidas", como diria Baricco. Não é mais questão nenhuma. Talvez por isso incomode, talvez. Porque se não é nada, não tem como curar, amenizar.
A cidade está aqui, os bares não saíram do lugar e nem o meu fígado ( apesar dos anos tentando destroçá-lo). É tão vazio que ultrapassa os limites do vazio. É espaço grande, é denso mas não preenche. Que diferença faz se estou no álcool ou no crack, meu bem? Eu mo falo: nem isso irá ocupar algum espaço, preencher.
Com que direito você acha que pode falar que me ama? Tirou a Ana sóbria de mim e ficou com a doce. E ainda fica andando acompanhado pensando em quando poderá me falar coisas de amor. Injustiça. Contigo, com quem te acompanha. A dor é de uma grosseria tremenda, não aceitou nem um chá quando lhe ofereci. Mas como eu estava falando... Ciclo das coisas não acontecidas, não é mesmo? Que guarda o significado de tudo aquilo que é! - berra Baricco aqui da janela.