Samstag, Dezember 26, 2009

Ao Caio, meu benzão

Antes de partir o ano eu tinha que te escrever, meu bem. Te dei um puta pontapé no meio do traseiro, eu sei, mas eu não percebi que tinha dado. Foi assim: acordei e de repente era eu, tão-somente eu, nada daquilo de acordar e não ser mais o que era. Eu era e estou sendo. E vou ser por um bom tempo e dentro dessa "desagregação de consciência" - como diria Bakhtin - você sobrou num canto tão esquecido que eu nem posso citá-lo aqui, porque não sei mais o nome, porque assim como um pai que perde o filho não tem adjetivo essa crise que nos embala também não tem.
O problema é que eu não tenho mais do que reclamar, passei assim pela vida imparcialmente, apertando a mão de todas as dores (elas eram tão belas!), sorrindo, etcétera. Só não cantei, porque a vida não toca mais nenhuma música para mim. Não, espere, não me interprete errado. Nada a ver com tristeza, nada disso, só que não toca mais e ponto, nada de choro, nada de vazios, nada dramático, nada de Édipo. Sobra muita beleza nessa vida sem música. Mentira, estou mentindo. Não sobrou beleza, é que não é essa beleza que eu e você estávamos acostumados, é uma beleza mais acinzentada, mais prática, que preenche os buracos mais rápido e por isso foi minha redenção.
Acabou que fiquei que nem você "barquinho na correnteza..." e a correnteza ficou até leve, calma, cheia de equilíbrio. Tudo agora está em sépia, eu não paro tanto para olhar cada esquina desse centro, eu nem acendo mais cigarros. Aliás, meu copo de pinga se perdeu, eu esqueci até como ela ardia na minha garganta e o hálito ficava puro álcool etílico, uma beleza. Daí, eu acendia outro cigarro (normalmente de filtro vermelho) e citava alguma coisa que você tinha escrito. E você não me escreve mais, é, você é quem não me escreve mais. Você agora escreve para eles, eles que me deixaram assim: imparcial. Droga, Caio!, você está me traindo. Eu devia saber que você é uma bicha louca que ia se perder nos braços dos ex-amores-de-minha-vida e ia me dar as costas. Agora você sussurra no ouvido deles e faz de mim uma zombie. "Eu não quero ser a zombie de ninguém.", a Atália dizia pro Manolo em Jogo da Amarelinha.
Está bem, tut mir leid. Eu sei que você nunca fez por mal, você só molda a minha imagem, você é todo eu, não é Caio? Dos seus anseios de sonhos até a sua morte de mártir. Você se lembra de quando eu sonhava pesado? Eu sempre falava antes de dormir "manchmal träume ich schwer" e dormia meio chorando, meio sorrindo. O choro era por auto-comiseração, o sorriso pela fé que me fazia dançar entre os sonhos. Eu abracei meus sonhos, aliás, eu caminhei até eles, joguei minha bolsa no chão e abracei meus sonhos. Eles não se despedaçaram nos meus braços como costumavam fazer. Eles me abraçaram também e estava sol. Caio, da última vez que eu sonhei pesado eu estava naquela terra, naquele lugar, naquela cama abraçada com meu sonho. Ainda espero você por aqui, assim, de coração vazio mas esperando. Eu sempre vou estar esperando você aqui sentada nesse banco de praça, e vou ficar olhando para você com vontade de dizer tanta coisa, mais tanta coisa que vou ficar só te olhando. Vou me lembrar de "como você me dói de vez em quando!"

Auf wiederhören,
Ana.

1 Kommentar:

beta(m)xreis hat gesagt…

gostei bastante de ler isso aqui. mexeu muito comigo.